A Polícia Civil do Rio de Janeiro realizou, nesta terça-feira (15), uma operação de grande porte contra um grupo criminoso que praticava crimes cibernéticos graves contra crianças e adolescentes. A ofensiva ocorreu simultaneamente em sete estados brasileiros e teve como alvos principais jovens envolvidos em ações de extrema violência virtual, como incentivo ao suicídio, crimes de ódio, maus-tratos a animais, tentativa de homicídio e divulgação de pornografia infantil.
Entre os investigados, um adolescente de 17 anos, apreendido dentro de uma escola em Criciúma (SC), foi apontado pela polícia como um dos líderes da quadrilha. De acordo com os investigadores, ele coordenava ações junto a outros três jovens. Também em Santa Catarina, foi cumprido um mandado de prisão temporária em Balneário Piçarras.
As investigações revelaram uma estrutura criminosa organizada, com atuação intensa nas redes sociais. O grupo criava “desafios” virtuais e transmissões ao vivo incentivando a automutilação, incluindo cortes no rosto e marcas com símbolos nazistas. Segundo a polícia, os integrantes chegaram a elaborar uma “tabela de preços” e pagavam para que adolescentes se ferissem em frente às câmeras.
“Eles obrigaram uma jovem a cortar, cortar mesmo a boca. Isso tudo transmitido ao vivo nas plataformas. Além disso, se automutilar com símbolos nazistas. Eles criaram uma tabela de valores. Pagavam para que jovens se automutilassem”, detalhou o delegado Cristiano Maia, titular da Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima, no Rio de Janeiro.
Apesar da violência dos atos, os jovens envolvidos, segundo a polícia, não apresentavam vulnerabilidade social. Possuíam estrutura familiar estável, frequentavam a escola e tinham acesso à internet. Seis dos suspeitos têm 18 anos atualmente, mas praticaram os crimes quando ainda eram menores, sendo, portanto, enquadrados no Estatuto da Criança e do Adolescente e sujeitos a medidas socioeducativas.
A operação foi deflagrada após um crime bárbaro cometido no início do ano, quando um adolescente de 17 anos lançou dois coquetéis molotov contra uma pessoa em situação de rua, no Rio de Janeiro. A vítima teve queimaduras em 70% do corpo e ficou hospitalizada por semanas. O ataque foi transmitido ao vivo por um soldado do Exército, que também foi preso. Cerca de 220 pessoas assistiram à cena pela internet.
Além da prisão dos autores diretos, a Polícia Civil alerta que os espectadores dessas transmissões também cometem crime e podem ser responsabilizados.
“Podem responder por associação criminosa, apologia ao nazismo, incitação à prática delituosa, entre outros crimes”, explicou o delegado Maia.
As investigações contaram com o apoio de duas agências norte-americanas – uma de defesa dos direitos humanos e outra especializada na proteção infantil – além do Laboratório de Operações Cibernéticas do Ministério da Justiça.
A secretária de Direitos Digitais do Ministério da Justiça, Lilian Cintra de Melo, chamou a atenção para o papel das famílias. “A gente vê com naturalidade pais dizendo que não querem invadir a privacidade dos filhos olhando o celular. Mas deixariam eles conversarem com estranhos na rua? Provavelmente não. Então por que permitir que crianças e adolescentes fiquem expostos a riscos tão graves na internet?”, questiona.
A Polícia reforça que o uso de apelidos e perfis falsos não impede a identificação dos envolvidos. “Temos técnicas avançadas, profissionais qualificados, e conseguimos chegar até eles, neutralizando esse tipo de crime”, afirmou o delegado Cristiano Maia.
A operação reforça o alerta: a violência digital é real e atinge, com profundidade, a vida de crianças e adolescentes em todo o país – inclusive em Santa Catarina.