Um levantamento do Tribunal de Contas de Santa Catarina (TCE/SC) revelou indícios de inconsistências em mais de 18 mil bolsas de estudo concedidas pelos programas Universidade Gratuita e Fundo Estadual de Apoio à Manutenção e ao Desenvolvimento da Educação Superior Catarinense (Fumdesc). Entre os casos identificados estão alunos cujas famílias possuem imóveis avaliados em até R$ 30 milhões, carros de luxo com valor superior a R$ 700 mil e embarcações como lanchas e motos aquáticas.
A análise, apresentada nesta quarta-feira (11) pelo conselheiro substituto Gerson dos Santos Sicca, indica que os indícios de irregularidade podem representar um risco financeiro de até R$ 324 milhões aos cofres públicos. Os dados foram obtidos por meio do cruzamento de informações cadastrais de 34.254 estudantes com registros fiscais e patrimoniais.
Segundo o TCE/SC, foram encontrados:
15.281 casos com divergência patrimonial;
4.430 com renda familiar incompatível com os critérios dos programas;
1.699 com vínculos empregatícios não comprovados;
335 de pessoas que não são naturais de Santa Catarina ou que não residem no Estado.
“Importante alertar que não se está criticando os programas, mas apontando falhas que podem comprometer a correta aplicação da política pública”, destacou Sicca em seu voto. Ele reforçou a importância de critérios de seleção mais rigorosos para garantir justiça no acesso às bolsas.
Entre os casos emblemáticos identificados pelo TCE estão:
Aluno cujo grupo familiar possui imóvel de R$ 30 milhões;
Aluno com carro de luxo avaliado em R$ 735 mil;
Famílias com empresas de capital social entre R$ 10 milhões e R$ 21 milhões;
Propriedades de lanchas e motos aquáticas que variam entre R$ 80 mil e R$ 202 mil.
O presidente do TCE/SC, conselheiro Herneus De Nadal, afirmou que os dados obtidos são apenas indícios, e que agora será iniciada uma nova etapa para confirmar as suspeitas. “Se comprovadas, essas condutas serão responsabilizadas. Caminhamos junto com a Secretaria da Educação, a Controladoria-Geral do Estado, o Ministério Público e a Receita Federal para dar sequência a esse trabalho”, declarou.
O diretor-geral de Controle Externo, Sidney Tavares Júnior, defendeu a fiscalização contínua. “É necessário garantir que apenas estudantes que realmente atendem aos critérios recebam o benefício. Cada bolsa indevidamente concedida representa a exclusão de um aluno que realmente precisa.”
Atualmente, o TCE/SC também avalia os mecanismos de concessão e controle das bolsas. Em 2024, o Tribunal analisou 131 cursos oferecidos por 59 instituições em 174 polos, identificando falhas tanto por parte das instituições de ensino quanto da administração pública.
O conselheiro José Nei Ascari reforçou que não apenas os alunos que possam ter fraudado os cadastros devem ser responsabilizados, mas também as falhas no sistema de controle precisam ser corrigidas. Já o conselheiro Aderson Flores destacou que o ponto central é a forma como o índice de carência é calculado, o que demanda aprimoramento legislativo e administrativo.
“Embora o número de inconsistências seja significativo, o valor do trabalho do Tribunal é fornecer dados concretos para que o Executivo possa aperfeiçoar o sistema”, afirmou o conselheiro substituto Cleber Muniz Gavi, comparando o cenário com a auditoria do TCU sobre o Bolsa Família em 2023.
Critérios dos programas
Criados pela Lei Complementar 831/2023 (Universidade Gratuita) e pela Lei 18.672/2023 (Fumdesc), os programas oferecem bolsas integrais ou parciais com base em critérios como:
Renda familiar per capita;
Situação de desemprego do aluno ou responsável;
Bens e patrimônio familiar;
Número de membros do grupo familiar;
Tempo de residência no Estado (mínimo de cinco anos);
Limite de renda: até 4 salários mínimos para cursos gerais e até 8 para Medicina.
Os casos mais graves serão encaminhados pelo TCE/SC ao Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) para apuração.