Os gaúchos lá daquela região onde nasci, fronteira com Uruguai e
Argentina, costumam fazer uso de aforismos repletos de sabedoria. Frases curtas,
compostas de palavras que trazem um sentido mais figurado do que literal. Elas
expressam experiências vividas; amor, alegria, sofrimento, erros e acertos. São
mensagens que os mais velhos repassam aos mais novos, como lições de vida.
Um dos ditos gauchescos mais bonitos, pela sua linguagem poética, e
mais inteligente, pelo seu conteúdo, é “Cavalo encilhado não passa duas vezes”.
Quem nunca morou nos pampas e não viveu épocas difíceis, em que o cavalo era o
melhor e único meio de locomoção, pode achar a frase de difícil entendimento. Por
isto, mesmo correndo o risco de ser mais chato do que sou, vou tentar explicar qual o
sentido que o autor da frase, desconhecido é claro, quis dar.
Antigamente, não havia humilhação maior para um gaúcho do que andar
a pé. Desde criança, todo o piá tinha a sua montaria. Mesmo os pobres, peões de
estância, utilizavam os cavalos, que pertenciam aos patrões. Mais do que o anseio dos
adolescentes de hoje em ter e poder dirigir um carro, era o desejo dos homens do
campo de ter um cavalo. Aqueles que não tivessem o privilégio de nascer numa
família que lhes propiciasse ter o seu, saíam campo à fora para conseguir um de uma
maneira ou de outra. Centenas de gaúchos pobres e até miseráveis participaram de
revoluções e guerras só pela alegria de ter um cavalo seu.
Assim, quem estivesse necessitado de ter um cavalo saía a pé pelas
coxilhas em busca de algum meio extraviado e desgarrado. Quando encontrava um
destes, mesmo em pelo, obtinha uma grande conquista. Pegava o primeiro que
aparecesse. Se tivesse, porém, a sorte de encontrar um encilhado, solto no campo,
então era o mesmo que acertar, hoje, numa dessas loterias que tem por aí. Assim, o
aforismo a que me refiro traz consigo a mensagem de que não se recusa nunca um
cavalo encilhado, porque, talvez, jamais a pessoa vá encontrar outro nesta condição.
A frase se costuma dizer para pessoas que são muito exigentes, que
deixam passar oportunidades que lhe são dadas, achando que, mais adiante,
encontrarão outra melhor. Será que não seria mais inteligente agarrar esta, enquanto a
outra não aparece? Isto vale para tudo, inclusive o amor. Às vezes uma pessoa deixa
de namorar ou casar com alguém, porque acha que vai encontrar, no futuro, outro
melhor; mais bonito, mais inteligente, mais rico, ou mais qualquer coisa. É comum
utilizá-la também em oportunidades de empregos ou negócios. Eu me lembrei de
escrever sobre isto, porque eu observo hoje em dia excelentes oportunidades para os
jovens estudarem, trabalharem e progredirem, desde que estudem e se esforcem um
pouco mais. O que vejo, porém, é muito desinteresse e desânimo. Talvez por serem
inexperientes ajam assim. Será que não estão deixando passar o “cavalo encilhado”,
de cujo desprezo por ele um dia irão se arrepender? Mas aí já passou.







