Depois da água, claro, a bebida mais antiga e mais popular da história é o vinho. Já que falei em água, é bom sabermos que o vinho já a substituiu em muitas ocasiões. Antigamente as viagens de navio eram muito demoradas. Era comum levar meses para concluir-se um trajeto entre a partida e o porto de destino. Como a água armazenada nos porões dos navios deteriorava-se rapidamente, os navegadores costumavam levar vinho consigo para ajudar a saciar a sede, pois o vinho demorava mais para estragar.
O vinho já foi muito utilizado como medicamento. Digestivo, cicatrizante e um excelente bálsamo contra a tristeza, que hoje chamamos de depressão. Bebiam-no os nobres, o clero e o povo em geral. É bom lembrar que Jesus também gostava. Afinal, ele era um poeta, pois falava por parábolas. Há tempo eu observo que algumas pessoas gostam de mistificar o vinho, dizendo-o bebida das elites e dos intelectuais.
Fazem cursos e vêm na roda demonstrar conhecimentos. Dizem que deve ser consumido a uma determinada temperatura, em copos ou taças especiais, em horas certas e com comidas adequadas. Ficam esnobando a nós, pobres mortais, aspirando buquês, fazendo o líquido girar nas taças. Põem uns goles na boca, fazem bochechos, ruídos desagradáveis e, por último, engolem-no com um estalo de língua. Um saco!
É bonito a pessoa entender de tudo um pouco na vida. Ou especializar-se em algumas áreas, como na música, na literatura ou no vinho, por que não? Mais bonito ainda é ter simplicidade. É respeitar o gosto dos outros e pelo próprio desconhecimento deles das frescuras que enumerei acima e, em especial, ao baixo poder aquisitivo que lhes impede de comprar vinho de melhor qualidade. É evidente que cada um possa dar a sua opinião, conforme seu gosto e grau de conhecimento, mas sem exagerar. Monopolizar uma conversa sobre qualquer tema é algo que torna um expert num chato de galocha. Espero que o meu jovem leitor saiba o que é galocha.
Em tese, todo o vinho caro é bom. Quem tem dinheiro, dificilmente erra. Basta chegar ao mercado e pegar o vinho de maior preço.
Sabedoria é adquirir um vinho que equilibre a qualidade razoável, de acordo com seu gosto, com o preço que lhe é mais acessível. Aqui, deixando a modéstia de lado, é a minha especialidade. Eu acho o vinho uma bebida cara. Isto se deve, em parte, a essa idéia maluca de elitizá-lo.
Como ele é a minha bebida preferida e as minhas condições econômicas razoáveis, o meu trabalho consiste em pesquisa e experiência. Eu fazia o seguinte: comprava um vinho, o mais caro que podia e um mais barato, que eu achava consumível. Provava e comparava. Aí ia baixando, gradativamente, do mais caro aos mais barato e subindo do mais barato ao mais caro, até encontrar o “ponto de equilíbrio” entre preço e qualidade. Quanto à temperatura, hora, comida para acompanhá-lo e outros detalhes, algumas regrinhas básicas poderão ajudar-nos a melhor apreciá-lo. Mas isso não é lei. Beba-o ao teu gosto, dentro das tuas condições econômicas. Sempre que te der vontade. Vinho combina com tudo, principalmente, com amor, música e poesia.